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tens algo a dizer? A Minha sopa. Olá. Quem sou eu? Sou o cara da sopa. Já nem sei mais se sou um cara normal. Sou, com certeza, um cara comum, mais um. Acho que já não posso ser considerado muito novo, não cozinho mais na primeira fervura, mas também não sou muito velho ainda. Pelo menos pensar isso é agradável. As idéias, as de hoje pelo menos, ainda estão na cabeça. As de ontem não sei onde foram parar. Apesar de ser interessante acreditar que escrevo porque me dá prazer, já penso que escrevo quando me sinto sozinho. Apenas mais uma mídia. Estou em algum lugar, que não vem ao caso e neste momento posso estar, ou não, comendo sopa. Prove e me diga o que pensas. Mas vá com calma que a sopa pode estar quente, ou fria, ou não ser do seu agrado. Seja camarada. E lembre-se, é sopa, só sopa, nada mais. Não estrague o seu dia por causa da sopa. B Um aviso: A resposta é não. C Outras sopas C2 Estágio probatório de sopas
D Sopas passadas 03.2004 04.2004 05.2004 06.2004 07.2004 08.2004 09.2004 10.2004 11.2004 12.2004 01.2005 02.2005 03.2005 04.2005 05.2005 06.2005 07.2005 08.2005 09.2005 10.2005 12.2005 06.2006 06.2007 10.2008 09.2011
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segunda-feira, abril 12, 2004CINDERELAA fada madrinha bem que tentou, mas anda muito desatualizada, os tempos são outros. A carruagem virou abóbora há tempos. Disso todo mundo sabe. Virou abóbora e Cinderela caiu de bunda no chão. Agradeceu por ainda não ter conseguido juntar dinheiro para colocar silicone ali, poderia ter perdido as próteses com o tombo. O príncipe não viu nada, estava explicando pro porteiro quem ele era, seu sobrenome, dizendo que o pai era político, lhe passou uma nota de 50 "pilas" discretamente para facilitar a sua saída antes de pagar a conta. Jurou que voltava em seguida. Depois foi puxado para um canto por uma loira muito a fim de sexo casual. Não resistiu. Foda-se a Cinderela. E isso foi há muito tempo. Desde então Cinderela trabalha duro prá esquecer o que poderia ter sido e não foi. Na verdade já esqueceu. Se preocupa tanto com as contas no final do mês que nem lembra mais como foi o baile. O sapatinho de cristal foi perdido um dia desses na subida da escadaria da favela enquanto Cinderela fugia apressada dos tiros. Foi roubado por uma quadrilha especializada antes que o príncipe o visse. Também, ele já tinha passado pelo sapato sem notá-lo. Ele também subia as escadas apressado, não pensava na Cinderela mais. Precisava de bagulho pro seu barato de Sábado. O sapato foi vendido no mercado negro, derretido e transformado num cachimbo pra crack. O dono do cachimbo não mora no morro, isso todo mundo sabe. Ele poderia até ser o pai do príncipe. Cinderela está esquecida e na miséria. Daria tudo para ter uma madastra malvada e um par de irmãs postiças que lhe oferecessem casa e comida em troca de um regime de escravidão. Perde horas no metrô até chegar ao trabalho do outro lado da cidade. Não tem carteira assinada e não ganha vale transporte, mas não se sente no direito de reclamar. É uma escrava de uma família que vive num apartamento de três quartos no Leblon. Aos Sábados eles recebem os amigos e servem lagosta e champagne. Cinderela trabalha até mais tarde. Não reclama. Todas as suas vizinhas estão desempregadas e acabaram trabalhando no tráfico ou se prostituindo para segurar as pontas. Ela dá duro na casa da patroa. Volta pra casa tarde e com medo. Muito medo. O príncipe foi para Nova York fazer um curso de teatro e nunca mais voltou. A cidade ainda era maravilhosa mas andava muito violenta para ele. O reino agora é governado por um sapo. O príncipe, apesar de formado em ciências políticas era uma figura muito frágil e estava muito distraído com as coisas que considerava "boas da vida" pra pensar em assumir qualquer responsabilidade. Que venha um sapo e coache bem alto, pedia o povo. Diziam que já estavam cansados de príncipes covardes. Talvez Cinderela ainda pudesse ser salva pelo sapo. Quem sabe? A abóbora apodreceu e não servia nem pra fazer doce. E mesmo se não tivesse apodrecido, quem teria tempo pra isso nesses dias. Além do mais a receita ficou no livro da vovó que foi pro lixo depois que ela foi internada num asilo público. Cinderela engravidou do padastro e espera na fila da Santa Casa para fazer sua primeira consulta de pré-natal. Ela está no sétimo mês. Tudo errado. A fada madrinha não anda mais com sua varinha de condão porque tem medo dos assaltos. Um dia ela encontrou a Cinderela numa parada de ônibus mas não pôde fazer nada. Estava sem a varinha e tão desconfiada do sujeito mal encarado à sua esquerda que não conseguia prestar atenção em mais nada. Na verdade mal reconheceu Cinderela daquele jeito, grávida, triste e sem esperanças. Se bem que o que poderia ter feito: o príncipe nem mora mais lá...
Esta sopa ficou pronta às 7:46 PM
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