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domingo, julho 25, 2004

NOTÍCIAS

Bom, começando pelo começo...
Essa foi uma semana que, sem nenhuma dúvida mudou a minha vida.
Às vezes a gente acha que a vida é boa, que as pessoas são felizes e boas, que algumas pessoas são más, mas e que as pessoas más acabam levando a pior, no fim das contas.
É conveniente a gente achar isso. Muitas destas coisas são verdade, a verdade mais pura. A vida é realmente maravilhosa, o maior presente de Deus para cada um de nós. Os amigos, o amor. 
Achar que o mau-caratismo não leva ninguém adiante, achar que tudo na vida tem uma consequência e acreditar piamente que a vida é um eco é bom. E a vida é um eco, mas é eco de vida, eco de energias, eco de coisas boas, não é eco de coisas ruins. Mas consequências ruin, coisas desagradáveis, acontecem para pessoas ruins e para pessoas boas, você já deve ter observado isso.
Tudo na vida, tudo mesmo tem um lado bom, sempre. A diferença está em como a gente encara os probelmas. Acreditem nisso. Eu constumo viver a vida assim, vendo o lado bom, fazendo piada com as atribulações, rindo da desgraça. É o meu jeito, sou assim. Sei que muitas pessoas gostam de mim, sei que outras não gostam, mas isso não estraga mais o meu dia como estragava antigamente. E agora, eu não estrago meus dias mesmo. Quem me conhece - ao vivo, ou um pouco melhor pela internet sabe disso. Sabem que minhas crises de mau humor são passageiras - se dissolvem em minutos - sabem que eu tenho essa mania irremediável de achar graça nas coisas mais bestas e de rir o tempo todo, como um bobo.
Certamente a minha característica mais marcante é o sorriso sempre pronto, gratuíto e às vezes até inoportuno. Meus amigos hão de concordar comigo nessa. 
E é isso que eu sou, um cara positivo demais, que sempre acha que tudo vai dar certo e que mesmo nas crises consegue se centrar e ver uma oportunidade, ou, quando isso não é possível, um cara que consegue acreditar que vai passar, e que com toda crise vem, pelo menos um ensinamento.
Claro que eu sou assim agora, mas antes eu já sofri, já me escabelei, já me deseperei. Mas com cada crise eu aprendi um pouquinho, e de pouco em pouco fui formando o cara que eu sou hoje. Acredito que quando a gente aprende algo, sejá lá como for, qualquer sofrimento vale a pena. E vale mesmo.

Nos últimos dias eu tentei várias maneiras diferentes de dizer isso que eu tenho pra contar para vocês hoje, para diversas pessoas diferentes, de diversas maneiras diferentes, mas sinceramente, ainda não encontrei um jeito fácil, simples, conciso e tranqüilo. Simplesmente não dá. Acho que não tem jeito bom. E não dá por um motivo simples: pelo estigma que essa doença tem. Sim, uma doença. Vocês devem estar pensando o que será e eu não vou fazer mais rodeios pra dizer que eu, aos vinte e oito anos de idade, estou com câncer.

Eu sei, eu mesmo, que já sei da notícia há exatos seis dias, quando reli o parágrafo acima me assustei... mas respirem fundo que o susto passa.

E eu estou me sentindo bem, e saibam, desde agora, que eu não vou morrer. Eu sei disso e Deus sabe disso. Essa doença me escolheu, e me chamou para a briga, e como não sou covarde, eu vou encará-la. Tanta gente já encarou, tanta gente continua lutando, tanta gente ainda vai lutar contra ela. E assim é a vida. A vida, ouviram?

Sempre que se fala a frase "eu tenho câncer", as pessoas ficam chocadas, mudas e atônitas. É inevitável. Mas eu não quero reagir assim, e não vou pensar em câncer como alguma derivação da palavra morte. Eu quero sim, que cada um de vocês entenda, assim como eu entendo, desde agora, que câncer não é sentença nenhuma. É uma luta, isso sim, é uma barra, isso sim, mas não é morte. E não vai ser dessa vez. Vocês vão ver.

Lance Armstrong, o ciclista que hoje mesmo venceu o Tour de France pela sexta vez, de forma inédita, é um sobrevivente de câncer assim como eu. Sim, um sobrevivente. Lance acredita que a partir do momento em que você é diagnosticado você passa a ser um sobrevivente, e é assim que se ganha essa guerra. Com certezas, certeza de que você vai sobreviver, com confiança e com uma coisa que eu tenho de sobra: otimismo. (E claro, uma ótima equipe médica.) 

Me inspiro também numa amiga que há anos luta contra isso e tem vencido, a cada dia essa batalha. A força, a perseverança e o otimismo dela agora fazem mais sentido para mim e eu me orgulho dela ainda mais do que me orgulhava antes. O nome dela é Paula e quem a conhece, sabe como ela é uma vencedora. A Paulinha também é uma sobrevivente. E é um grande exemplo prá mim, hoje, ainda mais.

Voltando ao Lance Armstrong, ele diz na sua autobiografia: "Pessoas boas, fortes, tem câncer e elas fazem tudo pra sobreviverem e ainda assim morrem.
Essa é a verdade essencial que você aprende. As pessoas morrem.
E depois que você aprende isso todos os outros problemas se tornam irrelevantes.
Eles se tornam pequenos."

E essa é a primeira lição que eu aprendi agora que sou um sobrevivente: Nada vale nossa raiva, nossa ira ou nosso mau-humor.
Nada.
Muito poucas coisas na vida são reais problemas. E isso é fato.

A segunda coisa que veio de aprendizado, já agora, é consequência direta do resumo que a gente faz da vida da gente quando sabe que tem câncer. Porque inevitavelmente, depois do choque e de alguns questionamentos que se faz movido ainda pelo medo, a gente acaba olhando para trás, buscando as pessoas, pensando na família, nos amigos, nos amores. E daí a gente aprende a fazer a pergunta certa e única.
"E se eu sobreviver, qual é a minha finalidade na vida?"

E desta pergunta advém todas as novas posturas, e surge um novo cara que sabe que tem muito a aprender com cada uma das pessoas que passam pelo seu caminho. Aprender e ensinar. Mas muito a aprender. E eu vou aprender com o câncer, eu sei. Depois do momento em que eu recebi aquele diagnóstico nasceu um outro cara, e esse cara é o guerreiro que vai enfrentar tudo isso.

Eu tenho um bocado de coisas a encarar a partir de agora, e não sei dizer se estarei mais ou menos presente aqui no blog. Mas eu, como já disse, estou pronto pra essa guerra e já me considero vitorioso: por estar fazendo as coisas certas, confiando num desfecho bom e tentando tirar o melhor aprendizado de tudo isso.
E eu vou acabar o post com mais um trecho traduzido (versão livre) da biografia do Lance Armstrong, que está sendo uma grande inspiração pra mim nesse momento, principalmente porque ele teve, há oito anos atrás, o mesmo tipo de tumor que eu tenho:

"Pessoas morrem. A verdade é tão perturbadora que fica até difícil de articular. Porque a gente segue adiante então? Porque não paramos e nos deitamos todos aqui mesmo? Mas existe uma outra verdade, também. Pessoas vivem. É uma verdade como a primeira, mas oposta.
As pessoas vivem, e vivem das maneiras mais fascinantes. Quando eu estava doente, eu vi mais beleza e triunfo e verdade num único dia do que em qualquer uma das minha provas no ciclismo - mas eram momentos humanos, e não milagres. Eu conheci um cara num terno acabado que revelou-se um grande cirurgião.
Eu fiquei amigo de uma enfermeira que trabalhava demais chamada LaTrice que cuidou tanto e tão bem de mim, de forma que aquilo só poderia ser o resultado de uma afinidade muito profunda.
Eu vi crianças sem sobrancelhas ou cílios, com os cabelos queimados pela quimioterapia mas que lutavam com o coração de campeões.
E eu ainda não entendo completamente o que aconteceu."



 

Esta sopa ficou pronta às 8:53 PM

 



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